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sexta-feira, 3 de julho de 2020

O PIB entre a dívida pública e a dívida externa (parte II/II)

O PIB entre a dívida pública e a dívida externa (parte II/II) (01/10/2015)



C. Dívida pública e dívida externa

15. Por a dívida pública e a dívida externa não serem mutuamente exclusivas, uma análise completa da dívida duma qualquer região requer a existência de quatro componentes: dívida externa pública (w), dívida externa privada (x), dívida interna pública (y) e dívida interna privada (z). O montante da dívida corresponde à soma da dívida externa (w + x) com a dívida interna (y + z) ou, noutra perspetiva, à soma da dívida pública (w + y) com a dívida privada (x + z).

16. Ora, os dados disponíveis em termos internacionais cingem-se a duas das semissomas sobreditas: dívida pública e dívida externa, portanto não comparáveis entre si. A comparação só ficaria salvaguardada se se conhecessem as restantes semissomas: a dívida privada e a dívida interna. Não obstante, quem não tem cão caça com gato – ou como o gato, para quem defende a corruptela do aforismo. Não podendo ser destrinçada, para a generalidade das nações, a dívida pública contraída externamente da que é financiada com recursos internos, socorre-se do total da dívida externa – revestindo esta a natureza pública ou privada –, no pressuposto aceitável e empiricamente confirmado de que a dívida externa representa uma proporção parecida tanto no cômputo da dívida pública como no da dívida privada.

17. Através dos cinco gráficos seguintes compara-se o peso da dívida pública (seja bruta ou líquida) com o da dívida externa. Ademais, apresenta-se o rácio entre a dívida externa e a dívida pública líquida. Ao contrário do procedimento adotado para efeitos da primeira parte do post, para a dívida externa não foi possível encetar uma abordagem semelhante à efetuada para a dívida pública bruta – recorde-se que para esta última usaram-se séries de dados referentes ao período de 2007 a 2014. Atendendo a que não se conseguiu obter informação para a dívida externa para diversos anos, decidiu realizar-se o estudo com base nos elementos respeitantes a 2014. Para assegurar uniformização, todas as séries reportam-se a 2014.

Gráfico 3.1


Gráfico 3.2



Gráfico 3.3




Gráfico 3.4




Gráfico 3.5



















18. Alguns dados relativos à dívida pública líquida não são totalmente rigorosos. Entre os 153 países apresentados nos gráficos anteriores, há 80 casos em que a dívida pública líquida é exatamente igual à dívida pública bruta. Tal decorre de duas razões. Em 64 das 80 situações desconhece-se a dívida líquida, pelo que, não por simplificação mas por prudência, pressupôs-se que essa dívida traduz a dívida bruta divulgada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Nas sobrantes 16 situações, o próprio FMI divulga que as dívidas públicas bruta e líquida coincidem.

19. Não se consideraram todos os 41 Estados-membros da OCDE ou da União Europeia, mas sim 39. No caso da Coreia do Sul, por falta de informação acerca da dívida externa. No caso do Luxemburgo, por a informação referente à dívida externa não refletir minimamente a realidade social do território. Note-se que o Grão-Ducado é uma exígua região, especializada tanto nos setores de atividade financeira como na concorrência fiscal. Tal especialização justifica a astronómica dívida externa, que atinge 3443% do PIB luxemburguês.

20. Debruce-se então sobre o teor dos gráficos de cima. No que concerne à dívida pública bruta, o Japão é o campeão destacado (com 238% do PIB), secundado a abissal distância pela Grécia (com 159% do PIB). Nesse domínio, Portugal ocupa a sétima pior posição a nível mundial (com 123% do PIB, de acordo com o FMI). Para o universo das 153 nações e dos 39 países da OCDE ou da União Europeia, as médias simples do peso da dívida pública bruta face ao PIB são, respetivamente, 50% e 70%.

21. No tocante à dívida pública líquida, a Grécia detém o mau protagonismo – 155% do PIB, somente menos 4 p.p. do que a dívida bruta. O Japão, apesar da diferença drástica entre a dívida bruta e a líquida – passando de 238% para 134% do PIB –, é o terceiro Estado com maior dívida líquida. Admitindo-se que na Jamaica as dívidas bruta e líquida igualam-se, este território das Caraíbas tem a segunda e a terceira dívidas líquida e bruta, respetivamente, mais elevadas (equivalentes a 147% do PIB).

22. Na dívida pública líquida, Portugal desce uma posição, passando da sétima para a sexta pior – 112% do PIB. No seio da OCDE ou da União Europeia, o território luso é o terceiro que possui maior dívida líquida, atrás do Japão e da Grécia que, como se infere do ponto anterior, assumem as duas piores posições. Neste capítulo da dívida, a Noruega, a nação que lidera a praxis democrática – de acordo com o índice de democracia concebido pelo jornal (ou pela revista) The Economist –, regista um orgulhoso superavit equivalente a 166% do PIB.

23. É verdade que esse europeu Estado setentrional pode gabar-se de causar a cobiça do Mundo pelo facto de dispor de tamanho excesso orçamental devido aos recursos naturais, especialmente o crude. Porém, levando em conta que há inúmeras regiões com maiores recursos naturais – inclusivamente o crude – do que a Noruega, tem de se admitir que a plaga (também) do bacalhau não se deixou afetar muito pelos vícios que o dinheiro concede. Tendo dalgum modo sido afetado, não foi hipnotizado pela vil facilidade a que tantos territórios não menos ricos em recursos têm assistido.

24. Vêm a talho de foice dois dos 41 trechos – o nono e o décimo – constantes do post«Viagem da Liverdade a Portugal», publicado no passado 24 de abril. No primeiro – «Países e Estados» –, realçou-se que «A maioria dum país deve ser proporcional à minoria do Estado. O grau de sustentabilidade duma nação é tanto maior quanto menor o hiato entre os rendimentos dos caciques do Estado e das corporações que dele dependem e os do povo, o fiel retrato de qualquer país.» No segundo – «Sociedades incoerentes» –, foi enfatizado que «O poder está para o povo, assim como o Estado está para o país. Uma sociedade funciona coerentemente se os recursos nacionais forem distribuídos em função dos pesos minoritário do poder e maioritário do povo. As situações utópicas de países ricos com Estados pobres, bem como os casos frequentes de países pobres com Estados ricos, são exemplos de sociedades incoerentes.»

25. Tão ou mais relevante do que a dívida pública é a dívida externa, quer se trate de dívida externa pública ou de dívida externa privada. Não tanto pela dívida em si – o stock da dívida – mas pelo seu custo – o serviço da dívida, que comporta os juros pagos e os restantes encargos suportados. Entre dois territórios com elevada dívida pública, é totalmente diferente quando um deles é dependente da dívida externa (ou seja, carece de poupanças criadas no exterior); diferente do segundo cuja fonte de financiamento é interna. No primeiro o serviço da dívida multiplicar-se-á em investimento dos outros territórios; no segundo, reproduzir-se-á em investimento do próprio. Diferença gigantesca.

26. Dado que as dívidas das nações – independentemente da natureza das dívidas – são algo estáveis ao longo dos anos, ou pelo menos são deveras menos voláteis do que o respetivo PIB, calculou-se a correlação entre a dívida externa (de 2014) e a média das taxas de crescimento real do PIB para o período de 2007 a 2014. Concluiu-se que, apesar de a ligação ser imaterial (-0,095) para o universo dos 153 Estados incluídos na análise, no que concerne aos 39 membros do espaço conjunto da OCDE ou da União Europeia a relação não é despicienda (-0,414). Ou melhor: a dívida externa tem um efeito negativo no crescimento económico.

27. É por isso que, entre os países atrás identificados nos gráficos, Portugal e o Japão encontram-se praticamente nos antípodas. Não obstante o peso descomunal da dívida pública japonesa, parte significativa desta será financiada por recursos gerados no próprio país, já que a dívida externa representa tão-só 45% da dívida pública líquida. Ao invés, a dívida externa portuguesa representa o dobro da dívida pública líquida nacional.

28. Ponderando paritariamente a dívida pública e a dívida externa, constata-se a símil amargura das situações portuguesa e grega, ambas com uma enorme dívida de esperança para a população meã, a atual ou a vindoura. O ligeiro benefício que Portugal apresenta perante a Grécia em matéria de dívida pública é consumido pelo pior patamar ao nível da dívida externa. Assim sendo, é motivo para duvidar sobre qual o arquiendividado e esboroado povo está mais longe de receber em definitivo a carta de alforria, se o lusitano ou o helénico. Arcando com dívida externa elevada e nível de competitividade flácido torna-se assaz difícil almejar por crescimento económico sólido.

29. A Islândia, com apenas 68% de dívida pública líquida face ao PIB, era a região com maior peso da dívida externa – 724% do PIB, pelo motivo explicitado no ponto 13. Por isso é o terceiro território com maior rácio entre a dívida externa e a dívida pública líquida; e aquele onde se inscreve a maior diferença entre essas dívidas (a externa e a pública líquida), 56% do PIB – no outro extremo situa-se o Japão, cuja diferença é de -74%. Por a Dinamarca dispor duma dívida pública líquida baixíssima, conhece o maior rácio atrás descrito – a dívida externa e a dívida pública líquida representam, respetivamente, 180% e 8% do PIB.

D. Conclusões

30. Algumas conclusões extraem-se do presente post, pese embora os resultados obtidos possam variar ligeiramente pela circunstância de a informação de base não ser tão robusta quanto desejável. A primeira conclusão, e que afeta sobremaneira a nossa Nação, é a de que a dívida pública coibirá o crescimento económico, em especial no que toca aos Estados que primeiro adotaram oficialmente o Euro. Os fortes embarcam nos cruzeiros; os ouros, no máximo, vêm-nos zarpar.

31. Para Portugal – e não só –, detentor duma economia periférica e bastante mais débil do que a da generalidade dos seus parceiros da zona monetária europeia, a dívida pública – esmagadoramente de origem externa – tem funcionado como uma mola retardadora do crescimento económico e da convergência real com os países da Europa Ocidental, crescimento e convergência sucessivamente aguardados. Conquanto tenha havido alguma aproximação nominal à média europeia, verifica-se que a entrada no Euro não impediu a continuação duma Europa a dois tempos.

32. Em linha com a oportuna mas desconsiderada antevisão dos pessimisto-realistas aquando da criação da moeda única, a Europa tem naturalmente sido encabeçada pelos territórios mais fadados, competitivos e com contas públicas controladas, que assistem ao aumento da distância efetiva face ao tolhido pelotão que, por muito esforçado que seja, não consegue encurtar espaço dado o rápido e consistente andamento dos da frente. O fracasso em termos de convergência real era previsível, atenta a impossibilidade de o mero alinhamento cambial esbater as clivagens estruturais e mesmo culturais entre os Estados-membros.

33. Para além disso – outra conclusão principal –, os dados parecem vincar que, acima da dívida pública, a dívida externa tem um efeito forte no crescimento das nações. É crível que haja uma tendência para que menor endividamento externo propicie melhores condições de crescimento económico, ceteris paribus. Um baixo grau de dívida externa, pública ou privada, constitui um fator propulsor de competitividade e crescimento. Apesar de poder ser tachada de lapalissiana, a última frase continua nos recônditos dos agentes económicos e dos decisores políticos. Pelos vistos envolve uma simplicidade labiríntica, demasiado complexa para pôr em prática.

quinta-feira, 2 de julho de 2020

O PIB entre a dívida pública e a dívida externa (parte I/II)

O PIB entre a dívida pública e a dívida externa (parte I/II) (24/09/2015)



A. Preliminares

1. O presente post tem como objetivo relacionar o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) com a dívida contraída pelos países. Para tal torna-se necessário conhecer, para além da taxa de crescimento do PIB, o peso da dívida. Se no atinente ao crescimento do PIB foi pacífica a obtenção dos dados, o mesmo não sucedeu com a dívida, o que, como será oportunamente referido, condiciona a análise.

2. Ainda acerca dos dados existentes, convém apresentar uma ressalva quanto à abordagem encetada, por esta não assentar nos montantes do PIB nem nos da dívida mas sim em rácios. Daqui decorre portanto um problema de comparação de variáveis de natureza distinta: o PIB é uma variável de fluxo (e de base anual), enquanto a dívida é uma variável de stock (visto que resulta da acumulação de dívidas anuais).

3. Para ultrapassar tal problema seria necessário efetuar um exercício hercúleo e ímpar, portanto quase impraticável, que consiste, por um lado, em mapear o serviço da dívida por anos em função da sua criação e, por outro, em transformar depois em preços constantes todas as componentes anuais do stock de dívida, de modo a compará-las com o PIB e assim retirar-se o efeito da inflação. Com o intuito de mitigar o vulgar problema, optou-se por usar, sempre que a informação disponível permita, a dívida (e o PIB) correspondente a vários anos.

B. PIB e dívida pública

4. Para tentar desatar o nó górdio, inicie-se a tarefa comparando, relativamente não a um ano mas a um período de oito anos (de 2007 a 2014), a taxa de crescimento real do PIB com o peso da dívida pública (em percentagem do PIB) – dívida bruta, seja de origem externa ou interna –, para dois conjuntos: o universo de 169 territórios soberanos e o espaço dos 41 Estados-membros da OCDE ou da União Europeia. Para a comparação adotou-se o coeficiente de correlação – vide gráfico 1. Em rigor o estudo deveria abranger a dívida pública líquida. Porém, a falta de informação obrigou a restringi-lo à dívida bruta.

Gráfico 1


5. Como se observa através do gráfico, a distribuição das correlações é assimétrica. Todavia é nítido que para os dois mencionados conjuntos existe tendência para uma ligação inversa entre a taxa de crescimento real do PIB e o peso da dívida pública. Para o universo das nações incluídas na análise, regista-se um efeito negativo em 70% dos casos – 118 em 169 –, subindo a percentagem para 80% – 33 em 41 – quando o grupo se restringe aos países da OCDE ou da União Europeia.

6. Portanto, em termos da área da OCDE ou da União Europeia, a dívida pública indicia prejudicar o crescimento do PIB. A penalização é confirmada por a média e a mediana dos coeficientes de correlação serem mais negativas para os 41 territórios dessa área do que para o universo dos 169. A título meramente ilustrativo adiante-se que os resultados extraídos mediante uma perspetiva similar, desta vez utilizando as taxas de crescimento nominal do PIB e não as taxas de crescimento real, estão algo próximos uns dos outros.

7. De facto, apesar de mais acentuadas usando as taxas de crescimento nominal, as médias e as medianas não se afastam demasiado das enunciadas no gráfico 1 para ambos os conjuntos – 169 e 41 Estados. Considerando o crescimento nominal do PIB, a média e a mediana dos coeficientes de correlação para o primeiro conjunto são, respetivamente, de -0,234 e -0,372 (logo, sem diferenças materiais face a -0,197 e -0,3, indicadores obtidos tendo por referência o crescimento real). Para o segundo, a média e a mediana fixam-se em -0,354 e -0,484 (que comparam com -0,309 e -0,387, para o crescimento real).

8. Para aprofundar a aferição do impacto da dívida pública no crescimento económico dos países, confrontando a média do peso da dívida bruta com a média do crescimento (real e nominal) do PIB, identificam-se três grupos. Dois deles já foram explicitados, i.e., o universo dos 169 territórios para os quais existem elementos que possibilitam o cálculo da média anual (de 2007 a 2014) da dívida pública e do crescimento económico, e o espaço das 41 regiões soberanas da OCDE ou da União Europeia. O terceiro grupo corresponde à dúzia de plagas fundadoras da zona do Euro. Os resultados constam do quadro seguinte.


9. Antes de comentar os valores do quadro, há que expor dois esclarecimentos. Um respeita ao âmbito do estudo. Os coeficientes de correlação do gráfico 1 distinguem-se daqueles a que o quadro se reporta. Os primeiros socorrem-se duma abordagem temporal, enquanto os segundos assentam numa perspetiva espacial. Rectius, os do gráfico espelham a ligação entre a taxa de crescimento do PIB e o peso da dívida pública; refletem, para cada nação, a relação entre o crescimento e a dívida, de 2007 a 2014 – que no caso português foi de -0,461 (-0,477 utilizando o crescimento nominal). Ora, diferenciadamente, a análise refletida no quadro decorreu, em primeiro lugar, do cálculo, por Estado e para o mesmo período de oito anos, da média das taxas de crescimento do PIB e da média do peso da dívida pública. Seguidamente determinou-se o coeficiente de correlação entre essas duas séries – médias do crescimento e da dívida.

10. O segundo esclarecimento prende-se com a decisão de adicionar o grupo dos 12 países da área do Euro. Uma vez que a média e a mediana dos coeficientes constantes do gráfico são relativamente diferentes consoante se trate dos 169 territórios objeto de estudo e do subespaço dos 41, uma avaliação separada para aquela dúzia de países teria necessariamente de ser realizada – sob a perspetiva espacial enunciada no parágrafo precedente –, com o intuito de aferir estatisticamente a conexão entre crescimento económico e dívida pública.

11. Se em termos reais – dimensão que releva, por oposição à nominal –, e para o universo das 169 nações, assiste-se a uma balbúrdia quanto ao efeito da dívida pública no crescimento do PIB, no espaço da OCDE ou da União Europeia o impacto negativo não é despiciendo. E embora parco, este impacto (-0,295) passa a significativo (-0,805) para as regiões do Euro, demonstrativo de que entre os Estados iniciais que adotaram a moeda única não houve, ao contrário do que se aguardava (com acrescida ansiedade e alguma fé), uma convergência económica. Infelizmente não se trata duma relação espúria. Corrobora somente o que era consabido, assente naquilo que o senso comum há muito defendia: o Euro beneficia acima de tudo as economias mais vivazes e estruturalmente robustas, em detrimento das menos apetrechadas em competitividade e em consolidação das contas públicas.

12. O gráfico 2 ilustra a ligação verificada para os segundo e terceiro conjuntos apresentados no quadro supra, no ponto 8: os 41 territórios da OCDE ou da União Europeia, e as 12 nações iniciais do Euro. Os coeficientes de correlação presentes no gráfico (como nota informativa) constam outrossim do quadro anteriormente apresentado. Para Portugal, durante o período de oito anos em apreço, a média das taxas de crescimento real do PIB e a média do peso da dívida pública cifram-se em 0,4% e 99%, respetivamente (sendo de 1,6% a média das taxas de crescimento nominal). Para os 41 Estados considerados, as medianas referentes a (a média de) as taxas de crescimento real e a (a média de) o peso da dívida são, por essa sequência, de 1,6% e 51%.

Gráfico 2




































13. Observa-se que os principais outliers comportam a Islândia, a Grécia e o Japão. A posição islandesa prende-se com o PIB; reflete o crescimento fortemente negativo em 2008 e 2009 (-26% e -33%, segundo a mesma ordem), fruto da tremenda crise do sistema financeiro que abalou o Mundo mas que nublou incomparavelmente mais a Islândia. Nesta ilha nórdica europeia a dívida pública não é problemática; é sim a dívida externa, contraída essencialmente pelo setor privado.

14. Bem diferente é a tragédia helénica, que tem origem na hórrida mistura explosiva que combina um nível incontornável de dívida pública com um período de depressão económica. Por outro lado, a situação nipónica é sui generis porque consegue conciliar um peso desproporcionado de dívida pública com crescimento económico, como se dum milagre se tratasse. Conforme se confirmará adiante, o milagre acontece por uma evidência nada transcendente e bem terrena: a dívida libertadora e reprodutora ou, numa aceção de geração de valor, a dívida benigna para o investimento.

quarta-feira, 1 de julho de 2020

O PIB mundial, os deuses e outras variáveis

O PIB mundial, os deuses e outras variáveis (11/05/2015)

    


A. Enquadramento

O título do post em apreço anuncia que o Produto Interno Bruto (PIB) decorre de diversas variáveis exógenas, sendo uma delas a religiosidade. Pese embora a equação de regressão inscrita na parte derradeira deste texto não integre qualquer variável de índole sagrada, a perspetiva divina foi utilizada para efeitos da descrição estatística das demais variáveis explicativas. A utilização teve como intuito aferir a relação entre essa perspetiva e as diferentes dimensões férteis que influenciam bastante o PIB, nomeadamente a democracia e a competitividade.

Acrescente-se que o modelo registado na subsecção E.2. não congraça com (qualquer uma das 11) variáveis de natureza religiosa porque, estando a população mundial distribuída na íntegra pelos vários cultos, a exclusão dalguns deles – exclusão norteada, como se elucidará, pelo critério objetivo da robustez dos parâmetros estimados – faria com que uma porção populacional não estivesse expressa no modelo, procedimento que seria incorreto. Para ultrapassar este problema, durante a incursão ao reduto do PIB usaram-se somente as variáveis independentes remanescentes, que abarcam o universo da população de todos os países considerados na abordagem econométrica final.

B. O PIB e os deuses

B.1. Descrição estatística

Se Deus é ou não omnipresente, unicamente a fé individual consegue responder. Antes de entrar na análise da ligação entre a riqueza anual dos cidadãos e a sua devoção, comece-se por segmentar a população mundial por género de crença. Os dados recolhidos quanto às estimativas da distribuição da população por religião resultaram da conjugação de três fontes. Uma, para identificar a quantidade de cristãos, muçulmanos, hindus, budistas, judeus, crentes de religiões populares, seguidores de restantes doutrinas, e ateus ou agnósticos; outra, para quantificar, no seio dos cristãos, os católicos, os protestantes e os ortodoxos; e mais uma, para distinguir, porventura a esmo, entre os muçulmanos, os sunitas dos xiitas. Por tratar-se de aproximações, as estimativas finais transportarão alguma margem de erro.

Para além dessa segmentação, no quadro 1 identificam-se as principais zonas onde se praticam as devoções. A informação discriminada acerca dos cinco maiores países incluída no quadro permite em grande parte explicar as diferenças de rendimentos médios per capita associados às crenças divinas. Tal sucede porque a discriminação abarca aproximadamente 66% da população terráquea – média ponderada calculada com base nas duas primeiras linhas (quota-parte afeta a cada tipo de religião e peso dos primeiros cinco maiores países).


Quadro 1

O quadro 2 permite comparar o peso de cada tendência religiosa em termos da população terrestre com o correspondente peso associado ao PIB planetário. Apresenta-se igualmente o valor (em dólares norte-americanos e a preços de 2013) do PIB per capita, outrossim por sentimento de fé. Do quadro pode depreender-se prima facie que o judaísmo é a doutrina que mais propende para a riqueza, enquanto o hinduísmo situa-se nos antípodas. Em média, o peso do PIB afeto aos judeus é 4,18 vezes superior ao peso da população ligada ao culto judaico, ao passo que o peso do PIB adstrito aos hindus representa tão-só 17% do peso da população associada à devoção hindu.


Quadro 2


Retomando a parte final do penúltimo parágrafo, e comparando os quadros 1 e 2, facilmente se compreende os motivos para tamanha discrepância entre o judaísmo e o hinduísmo. Dos cinco maiores territórios com judeus fazem parte Israel e os E.U.A. – que entre si reúnem 84% da população judaica –, e ainda o Canadá, a França e o Reino Unido, portanto países cujas posições no ranking mundial do PIB per capita – reporte a 2013 – situavam-se entre a 11.ª (E.U.A.) e a 27.ª (Israel). Ao invés, dos cinco maiores países com hindus há, para além da Índia – que domina, com 94% do total da população hindu –, o Nepal, o Bangladesh, a Indonésia e o Paquistão que, no conjunto dos 191 territórios com informação sobre aquele ranking, ocupavam posições assaz modestas, entre a 120.ª (Indonésia) e a 171.ª (Nepal).

B.2. Abordagem econométrica

É arriscado afirmar perentoriamente que existem apegos a Deus mais ou menos predestinados para a geração de riqueza material. Não obstante, para cada uma das 11 dimensões sagradas – excluem-se os grupos dos cristãos e dos muçulmanos, por aglutinarem cinco dimensões autónomas –, é bastante diversificada a correlação entre o logaritmo neperiano do PIB per capita (ln PIBpc) e a forma como o Homem comunica com Deus: vai desde -0,25 no caso dos sunitas, até 0,42 no dos ateus ou agnósticos. Perante esta amplitude, dispensa-se por conseguinte a explicitação dos demais nove coeficientes de correlação.

Cumpre acrescentar que a conexão entre o ln PIBpc e a fé (ou melhor: as 11 variáveis de cariz religioso) tem fraca robustez (coeficiente de determinação de 0,31) – vide célula (A.1) do quadro 6 da subsecção E.1. Adiante-se todavia que, conforme consta desse quadro, o valor F de significância – nível de significância usado para aferir o erro de rejeitar indevidamente o cenário de ausência de regressão – é ínfimo, e os p-values associados aos parâmetros estimados para as variáveis de proveniência divina – valores que dão a conhecer o nível de confiança (1 – p-value) para não aceitar a hipótese de parâmetros nulos – também são negligenciáveis. Daí concluir-se com segurança, através dos elementos disponíveis, não ser de refutar a possibilidade de as variáveis independentes respeitantes ao culto justificarem uma parte (31%) das diferenças do ln PIBpc.

C. O PIB e a democracia

C.1. Descrição estatística

O quadro 3 apresenta a distribuição da população e do PIB mundiais, em função da devoção religiosa e do nível democrático. Para tal utilizou-se a tipologia criada por The Economist. Este jornal insuspeito avalia os estádios de desenvolvimento democrático dos países – apoiando-se em cinco categorias, a saber: processo eleitoral e pluralismo, liberdades civis, funcionamento do governo, participação política, e cultura política –, classificando os Estados em democracias plenas, democracias imperfeitas, regimes híbridos ou regimes autoritários, consoante o índice de democracia (calculado pelo citado jornal) pertença aos intervalos (80, 100], (60, 80], (40, 60] ou [0, 40], respetivamente.


Quadro 3

As percentagens das duas últimas colunas do quadro 3 diferem em termos infinitesimais das registadas nas penúltima e antepenúltima do quadro 2 por o universo não ser exatamente o mesmo. Dos 191 territórios subjacentes à secção precedente – análise estrita da religião –, apenas se conseguiu obter dados referentes à qualidade democrática em 162 casos – representativos de 99,3% da população e 99,5% do PIB mundiais.

Pelo quadro anterior percebe-se que, entre a população mundial que vive em democracias plenas (12%), 35% é protestante, 28% é descrente e 24% é católica. Da população mundial que habita em democracias imperfeitas (37%), 38% adota o hinduísmo (da qual 94% é indiana), 24% o catolicismo e 16% o sunismo. Entre a população que reside em regimes híbridos (13%), 52% é sunita, 15% é católica e 12% é protestante. Por fim, da população embutida em regimes autoritários (38%), 30% descrê de Deus (da qual 62% é chinesa), 20% adota o sunismo e 14% segue religiões populares.

Se se fizer uma leitura do quadro não por coluna – por transparência democrática – mas antes por linha – por fé divina –, evidenciam-se algumas constatações. O entrosamento dos cristãos com a democracia é altamente divergente: 56% dos católicos residem em democracias imperfeitas e 18% em democracias plenas – e 13% em regimes autoritários –; 34% dos protestantes provêm de democracias plenas e 27% de democracias imperfeitas – também 27% de regimes autoritários –; e 66% dos ortodoxos habitam em regimes autoritários – 60% desses cristãos estão instalados em dois Estados com portas viradas para tais regimes (Rússia e Etiópia).

A afeição dos muçulmanos à democracia não é tão divergente, conquanto substancialmente pior, confirmando assim a suspeita fundada em observações empíricas. Somente 1% quer dos sunitas quer dos xiitas vivem em democracias plenas, residindo 30% dos sunitas e 15% dos xiitas em territórios com democracias imperfeitas. Quase 2/5 (38%) dos sunitas e acima de metade (55%) dos xiitas habitam em países com regimes autoritários. Para as sobrantes seis segmentações, a informação do quadro 1, no que toca à identificação dos cinco maiores países por prática religiosa, permite justificar significativamente a convivência entre o mundo sagrado e a realidade democrática.

As cinco colunas de rácios (entre o peso no PIB e o peso na população) inscritos no quadro 4 obtiveram-se mediante os elementos do quadro antecedente. Ademais, o quadro seguinte inclui o valor do índice de democracia para cada tipo de culto. Salienta-se a amplitude máxima de 3,35 subjacente à segunda coluna – «Democracia imperfeita» –, proveniente da circunstância de o maior rácio (3,5) depender maioritariamente de Israel e o menor (0,15) estar associado sobretudo à Índia, ambos os países com democracias imperfeitas na terminologia instituída por The Economist.


Quadro 4


C.2. Abordagem econométrica

Com base nas duas últimas colunas do quadro 4, conclui-se que, para os 11 conjuntos que têm sido tratados, os rácios entre as percentagens no PIB e na população mundiais estão positivamente unidos (0,57) com os índices de democracia. Aplicando similar comparação (entre tais rácios e índices) não em termos dos grupos de devoções mas sim no respeitante aos 162 territórios individualmente considerados, há uma leve descida da correlação (para 0,51).

O índice de democracia responderá per se 33% das variações do ln PIBpc e, juntamente com a variável artificial (ou dicotómica) afeta à condição de os países pertencerem – valor 1 – ou não – valor 0 – à OCDE ou à União Europeia, justificará 45% das mesmas – células (A.2) e (A.3) do quadro 6. O aumento do coeficiente de determinação decorrente da introdução da variável relativa à OCDE ou à União Europeia deve-se ao facto de, entre as 25 democracias classificadas de plenas por The Economist, 21 integrarem a OCDE (das quais 12 são Estados-membros da União Europeia), e uma (Malta, concretamente) integrar a União Europeia mas não a OCDE – as restantes são Costa Rica, Maurícia e Uruguai. Entre os 13 Estados da OCDE não qualificados como democracias plenas, uma dúzia são democracias imperfeitas – nove pertencentes à União Europeia, uma delas a democracia portuguesa –, correspondendo o 13.º ao regime híbrido vigente na Turquia.

Testou-se seguidamente a regressão entre o índice de democracia e as 11 variáveis de cariz divino. Como os valores F de significância e os p-value atestam, o índice de democracia é condicionado pela (des)confiança nos deuses – coeficiente de determinação de 0,5, como se observa na célula (B.1) do sobredito quadro 6. De acordo com os coeficientes de correlação entre cada uma das variáveis sagradas, por um lado, e o índice de democracia, por outro, ressaltam alguns resultados estatísticos: encontram-se positivamente ligadas à democracia as percentagens de populações ateias ou agnósticas (0,41), católica (0,31) e protestante (0,29), enquanto as doutrinas mais negativamente influenciadas revelaram ser as populações seguidoras do sunismo (-0,49), do xiismo (-0,35) e das religiões populares (-0,21).

D. O PIB e a competitividade

D.1. Descrição estatística

À semelhança do efetuado anteriormente – em que se apresentou, por segmentação religiosa, os rácios entre os pesos no PIB e na população mundiais –, do quadro 5 constará análoga comparação, desta vez substituindo o PIB pela competitividade. O quadro inclui igualmente o índice de competitividade, bem como o número de feriados anuais.

Para efeitos da competitividade, aproveitaram-se os índices mensurados pelo Fórum Económico Mundial e, no tocante ao número de feriados, usou-se a informação divulgada através do sítio qppsudio.net, não tendo, no que a tal número se refere, o levantamento sido restringido aos feriados nacionais. Para mensurar os feriados, empregaram-se diferentes ponderações em função da sua natureza; por exemplo, aos feriados aplicáveis só à função pública ou ao setor bancário adotaram-se, segundo esta ordem, os pesos de 0,4 ou 0,25.

Para a abordagem econométrica descrita em D.2, utilizou-se ainda a variável do saldo comercial respeitante aos produtos petrolíferos (em percentagem do PIB de cada país), cujos dados foram obtidos com base na informação extraída do sítio atlas.media.mit.edu. Ante os elementos disponíveis, esse saldo traduzirá um superavit de 7,6% do PIB afeto às populações xiitas e um défice de 5% do PIB associado às populações hindus.


Quadro 5


A penúltima coluna do quadro 5 difere ligeiramente da registada em quadros precedentes porque o universo é diferente. Com efeito, os 162 territórios mencionados em C.1 – que por seu turno haviam sido 191 antes da introdução do índice de democracia – decresceram para 141 com a adição do índice de competitividade. Com o decréscimo, ficaram representados 94,7% da população e 98,5% do PIB mundiais.

A segunda coluna do quadro, relativa à percentagem da competitividade mundial por tipo de devoção, não evidencia diferenças assinaláveis face à percentagem do PIB mundial constante de quadros anteriores. Está em linha com a conclusão (referente à forte articulação entre a competitividade e o PIB) extraída do post «Competitividade – Do elixir do crescimento aos planos quinquenais de pensamento», publicado em duas partes, em 29 de agosto e 2 de setembro de 2014.

A primeira coluna reflete, para além da média ponderada do índice de competitividade – competitividade em sentido estrito – em função do peso de cada conjunto religioso, a (maior ou menor) dispersão da competitividade entre os países que compõem tais conjuntos. O judaísmo denota uma maior competitividade em virtude de os cinco principais países com população judaica – que captam 91% do número total de judeus (vide quadro 1) – ocuparem, no ranking dos 141 territórios analisados, posições deveras apreciáveis, entre a 6.ª (E.U.A.) e a 27.ª (Israel).

O grupo das populações sem crenças religiosas era o segundo mais competitivo, sendo a China – 29.º lugar no ranking mundial da competitividade – responsável por 62% da explicação, conforme citado na parte final do terceiro parágrafo de C.1. Nos antípodas da competitividade estavam as doutrinas sunita, xiita e ortodoxa. Quanto a esta última, tal como já realçado a propósito do PIB per capita, 60% do modesto registo em matéria de competitividade deve-se à Rússia e à Etiópia – 61.ª e 119.ª posições no ranking.

Outra variável usada no âmbito da competitividade em sentido lato – ou seja, não exclusivamente o índice de competitividade – passa pelo número de feriados. Como se abordará na próxima subsecção, existe um ligeiríssimo efeito negativo entre a cadência de feriados e a produção de riqueza. As situações extremas fixam-se ao judaísmo e ao xiismo, com 13 e 22 feriados por ano. A nível mundial, a média ponderada da frequência de feriados ronda os 16.

D.2. Abordagem econométrica

Neste exercício – por oposição ao realizado aquando da elaboração do post bifásico atrás identificado, publicado em agosto e setembro do ano transato –, entre o ln PIBpc e o índice de competitividade a correlação mantém-se em 0,84, pelo que cerca de 70% das variações desse logaritmo prender-se-ão com a competitividade, o alfa e o ómega da riqueza das nações ou, para os irredutíveis céticos quanto à divina transcendência, a sacrossanta variável – célula (A.5) do quadro 6. Com a introdução das variáveis referentes ao saldo petrolífero e ao número de feriados, a aderência do modelo beneficia dum aumento subtil, para aproximadamente 76% – célula (A.8).

Retomando o último parágrafo da subsecção anterior, estima-se que a variável respeitante ao número de feriados afetará muito tenuemente o PIB e a competitividade. Através dos dados existentes, observa-se uma correlação frágil de -0,18 e impercetível de -0,08 entre tal número e, pela respetiva ordem, o ln PIBpc e o índice de competitividade. Relativamente ao saldo petrolífero, trata-se duma variável que influenciará um pouco as diferenças do ln PIBpc – coeficiente de correlação de 0,25.

Atendendo aos elementos disponíveis, a religiosidade justificará 32% das variações da competitividade – célula (C.1). A regressão entre o índice de democracia e o índice de competitividade é de 30% – células (C.2) e (B.5). Se ao sagrado e ao índice de democracia se acrescentar a variável artificial – integração na OCDE ou na União Europeia –, a regressão estabelecida entre essas variáveis e o índice de competitividade aumenta para 0,53 – célula (C.4).

E. O PIB e a interação das variáveis explicativas

E.1. Cenários analisados

O quadro seguinte – que por diversas ocasiões foi mencionado, nas subsecções B.2, C.2 e D.2 – sintetiza os resultados no que toca aos coeficientes de determinação, aos valores F de significância e aos p-value alusivos aos cenários analisados. Reconheça-se que alguns destes têm, em termos práticos, duvidosa validade, especialmente certos cenários em que a variável endógena consiste no índice da democracia, visto que para o senso comum é mais lógico que a democracia seja uma variável explicativa do que uma variável dependente.


Quadro 6


Como se constata, os 20 modelos testados apresentam uma indiscutível robustez, porquanto o valor F de significância de todos é praticamente nulo. Contudo, desses modelos destacam-se dois principais constrangimentos: os casos em que, apesar de os p-values serem confortavelmente reduzidos, os coeficientes de determinação são algo exíguos – células (A.1), (A.2), (A.3), (B.1), (B.5), (B.6), (B.7), (B.8), (C.1), (C.2) e (C.3) –; e as situações em que os p-values são elevados (acima de 0,05), sejam os coeficientes de determinação suficientemente elevados – células (A.9) e (A.10) – ou não – células (A.4), (B.9) e (C.4).

As células (A.5), (A.6), (A.7) e (A.8) traduzem os únicos modelos em que se conjugam coeficientes de determinação relativamente elevados com p-values imateriais. Resumem-se a regressões que envolvem a competitividade em sentido amplo – leia-se: o índice de competitividade, o saldo petrolífero e o número de feriados. O modelo mais completo, o que integra as 16 variáveis, ainda que disponha dum coeficiente de determinação de 0,83, contém seis p-values acima de 0,05 – a saber: 0,208, referente ao número de feriados, e 0,09, 0,067, 0,056, 0,055 e 0,054, associados a variáveis religiosas –, nível de significância máximo entendido como aceitável para aferir a qualidade dos parâmetros estimados pelo método dos mínimos quadrados.

E.2. Modelo final

Há assim que aferir o modelo (A.10) de modo a apurar, em simultâneo, um coeficiente de determinação forte, um valor F de significância baixo e todos os p-values reduzidos, para assegurar a robustez quer do modelo, quer dos parâmetros associados às variáveis exógenas. Logo, tomando como ponto de partida os 141 países para os quais há dados atinentes às 16 variáveis usadas para justificar o ln PIBpc, houve que, em primeiro lugar, testar a indesejável existência de multicolinearidade (ou inexistência de independência) entre as variáveis explicativas.

À primeira vista, a avaliação das correlações indiciava afastar a hipótese de multicolinearidade. Na verdade, os correspondentes coeficientes de correlação não excedem 0,68 e 0,58 – obtidos entre a variável artificial (de integração na OCDE ou na União Europeia) e, respetivamente, o índice de democracia e o índice de competitividade. Excluindo a citada variável artificial, o maior coeficiente de correlação (0,54) ocorre entre os índices de democracia e de competitividade.

Não obstante, sob a perspetiva dos VIF (variance inflation factor), foi preciso excluir uma variável – a variável religiosa respeitante à população sunita de cada país, por o VIF atingir o valor de 38, portanto inequivocamente elevado para recusar a ausência de independência com as variáveis explicativas remanescentes. De facto, apesar de os coeficientes de correlação serem inferiores a 0,7, seria expectável a presença de multicolinearidade, como o segundo parágrafo do post poderia antever. (Note-se que, se noutras ocasiões ao longo deste post, mercê dos resultados das análises efetuadas, foi possível inferir dalgum modo quanto à maior ou menor importância duma qualquer variável sagrada face às congéneres, na situação em causa tal inferência não tem validade estatística.)

Refez-se então o modelo com as 15 variáveis sobrantes. Os novos VIF daí decorrentes foram inferiores a 5 – valor aceitável como o limite crítico acima do qual não se deve rejeitar a hipótese de multicolinearidade. Porém, sob o critério de rejeição das variáveis com p-value superior a 0,05, concluiu-se a suspeita empírica evocada no início deste post, sobre a necessidade de retirar as variáveis divinas. A supressão destas variáveis visando salvaguardar a robustez de todos os parâmetros das variáveis exógenas fez com que o coeficiente de determinação aumentasse de 0,83 – célula (A.10) já anunciada – para 0,86.

Após essa exclusão, e visto ter sido confirmada a hipótese de os resíduos seguirem uma distribuição normal com média nula e variância constante, foram ainda extraídos cinco outliers – Argentina, Líbano, Malawi, Ruanda e Venezuela –, para os quais os resíduos-padrão excediam, em módulo, 1,96 desvios-padrões dos resíduos (implícitos a um intervalo de confiança bicaudal de 95%). Com o afastamento dos mencionados outliers, houve um aumento negligenciável da regressão (que passou de 0,859 para 0,864).

Encontra-se abaixo reproduzido o modelo final, mais parco em variáveis – redução de 16 para cinco –, e em que CoDePeFe e dOU representam, por essa ordem de apresentação, o índice de competitividade (0-100), o índice de democracia (0-100), o saldo dos produtos petrolíferos (em percentagem do PIB do país), o número de feriados anuais, e a integração (ou não) – variável dicotómica – na OCDE ou na União Europeia. Os parâmetros estimados afetos às cinco variáveis estão associados a p-values não superiores a 0,007.



F. Notas finais

Se bem que a abordagem explicitada neste post, referente à fundamentação das diferenças dos PIB per capita entre os países, possa afigurar-se de redutora – desde logo por a realidade de cada país revestir um caráter monolítico –, é indesmentível a consistência dos resultados tanto com a teoria económica como com o exame econométrico. A robustez dos resultados não assenta em variáveis espúrias nem fantasiadas. Bem pelo contrário. Dimana de redolentes e cintilantes variáveis que o senso comum facilmente compreende e valida, em especial a competitividade e a democracia, porventura as imperecíveis arquivariáveis da criação de valor, ainda que anónimas e desmascaradas.

As outras divindades, as enraizadas nos interesses imolados do tempo, funcionam frequentemente como meros placebos da ineficiência e da iniquidade. Não se trata dum incentivo à iconoclastia ou a semelhante afronta às crenças religiosas; antes uma reflexão sobre a virtude do humanismo. Pode ser que no futuro a força dos deuses se altere – exclusivamente em nome do Homem.


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