domingo, 8 de novembro de 2020

Do catraio resistente ao adolescente falhado – Afundar ou recuperar?

 



















Mudança de idade

O pico da crise de identidade do rapaz verificou‑se no final de junho deste ano. Foi como se ele tivesse assistido ao auge de uma guerra civil. Ficou gravemente ferido e com diversas fraturas expostas. A recuperação exigirá, no mínimo, um longo período, se tudo correr pelo melhor, i.e., num cenário assaz otimista.

As guerras são quase sempre desnecessárias. Pior que isso: pela parte de quem defende a justeza da sua causa, as guerras aumentam as chagas que, já de si, seriam dificilmente saradas. O maior problema das guerras nem reside tanto em começá‑las, mas sim na incapacidade de as acabar ou até de fazer diminuí‑las de intensidade.

Quando uma guerra é deixada ao sabor da sua força irada, pode haver ganhadores, mas por certo todos saem perdedores. O moço perdeu, bastante mais do que o conjunto dos seus apoiantes de visões antagónicas.

 

Há 15 anos

«Se não interviermos e desistirmos, falhamos», eis o lema do petiz, cujo registo oficial remonta a 31 de julho de 2006. Não obstante, ele já existia 265 dias antes da data em que o seu nascimento foi lavrado. Há precisamente 15 anos, em 8 de novembro de 2005, celebrou‑se a sua vinda ao mundo, anunciada através da criação de um blogue.

Década e meia constitui tempo suficiente para proceder a um balanço. E tem tanto que contar. O quadro acima apresentado é autoexplicativo, e justifica o título atribuído ao presente post. Outrora um catraio resistente; ora um adolescente falhado; e o futuro?

Conforme se comprova, a vida do rapaz de 15 anos conheceu quatro fases: a primeira, até 2014; a segunda, entre 2015 e 2017; a terceira, compreendida entre o início de 2018 e o final de junho de 2020; e a quarta, a partir de julho de 2020. Sintetize‑se cada uma delas.

 

Fase do encanto

Até aos nove anos o miúdo era dinâmico e respirava esperança. Bastantes membros adoravam‑no e incentivavam‑no, como sucede aliás quando se lida com qualquer ser de tenra idade. Por ser adorado e incentivado ainda quando usava fraldas, o pequeno sentia‑se sobredotado. Assim que começou a proferir as primeiras palavras, apregoou publicamente, sem a mínima hesitação e à guisa de convicção premonitória, que «desistir é falhar». O fim desta fase vivaz da infância coincidiu com o lançamento de um livro: «Desistir É Falhar!», como se impunha.

Todavia, a etapa final da infância trouxe vincadas divergências internas. Uns entendiam que, por mais tempo que decorresse, a idade da inocência tinha de continuar; outros tantos defendiam que era o momento para o garoto deixar de ser criança; e a restante maioria, profundamente resignada, não quis pronunciar‑se sobre o rumo a seguir.

A divergência acentuada de opiniões entre os apoiantes ativos foi a gota da divisão inicial que rachou a coesão em torno do puto. Houve quem, porque já não estava muito encantado com o petiz arrogante, perdeu o resto do encanto e despediu‑se dele à sorrelfa e sem chama; houve outrossim quem se afastasse mediante a apresentação de uma honrada declaração de saída; houve ainda quem o mantivesse animado, não obstante tratá‑lo como um rapazote e não como um menino mimado.

 

Fase da incerteza

Tal como em tudo na vida, só faz falta quem está. Mas a vida reconhece que há os que devem fazer falta e os que nunca deveriam fazer falta, ou seja, jamais deveriam estar. Erros da vida, que recaíram sobre o cachopo. Como o quadro denota, o contributo dos que deixaram de trabalhar para o garoto em 2014 – N e S – não foi minimamente compensado com o resultado dos novos apoiantes entre 2015 e 2017 – T, U, V, W e X (mesmo não tendo um destes qualquer laço familiar com o jovem), e outros cujo fruto se traduziu, de forma exata e rigorosa, no blogue e no vazio à sua volta, em nada. Saliente‑se que este comentário – acerca da comparação entre os que saíram e os que entraram – apenas se cinge à atividade do blogue. A realidade foi bem mais mordaz do que o blogue indicia.

A partir de 2015 o menino – para alguns – deixou de ter carregadores de piano. Poderá parecer injusto usar esta designação aparentemente pouco elogiosa para quem fazia o meritório papel de formiga no seio gregário. Não é o objetivo. Basta trazer à colação a fábula da formiga (cessante) e da cigarra (cantante e – após a saída da formiga – reinante). Num ápice, a organização interna desapareceu por completo. Para além disso, urge realçar que por mais firme que a abelha‑mestra se mantenha no cortiço, sem obreiras não há fabrico de pingo de mel.

A confirmação da reconhecida importância dos carregadores de piano, das formigas, das obreiras foi bem audível (e visível) em 2016. Até então não existira um ano tão fraco em termos de atividade (excluído obviamente o ano inicial de 2005 que, conforme supra indicação, contou com somente quase dois meses de vida).

Depois do efeito estrondoso da substituição de formigas modestamente obreiras por cigarras vaidosamente cantantes, em 2017 registou‑se uma tentativa de repor o dinamismo do catraio. Foi o canto do cisne, que marcou o fim da segunda fase. Porém, como se não fosse suficientemente péssimo o fim das formigas e o consequente rumo incerto do pequeno coadjuvado por cigarras, havia que agravar a sua vida ultradébil – debilidade advinda da circunstância de já serem uma saudosa miragem quer os debates internos (seja à distância, mediante a comunicação por e‑mail, seja presencialmente, durante os encontros em jantares‑convívio), quer os eventos externos.

 

Fase do declínio

Finda a segunda fase, foi emitido o certificado de agravamento da debilidade permanente. Com efeito, se aquando do lançamento do livro a divergência de opiniões abriu rachas, estas aumentaram logo no princípio de 2018. Fizeram com que a família se fosse desmembrando e o adolescente fosse votado ao abandono (por todos, sem exceção).

A paz do miúdo implodiu nessa data devido à conjugação de dois efeitos que minaram o seu funcionamento: rascunho e silêncio. A declinante e beligerante fase do rascunho e do silêncio vigorou cerca de dois anos e meio. O blogue do jovem abandonado passou a funcionar como um blogue pessoal de um dos seus apoiantes, como se de um albergue espanhol se tratasse. Mais: funcionou como um blogue panfletário de luta fraticida, impetuosamente crescente, emocionalmente incitada e racionalmente justificada.

Durante a guerra impera a desordem. Foi a resposta natural à desorganização interna, concretamente na área informática, e à sua couraça formada pela liga feita à base de rascunho e silêncio. Nada funcionou: a família institucional não interveio, o fórum de debates desistiu, e portanto a reflexão económica e social falhou, ao invés do pregão do lema.

Nos tais dois anos e meio não existiu uma única tentativa para reconhecer que rascunho e silêncio constituíam uma doença que se intensificava dia a dia e podia levar ao descrédito e ao fim da família. Fracasso completo, pois não houve a mínima prudência para estancar o problema quando este dera os primeiros sinais. A cisão retumbou e conduziu ao inadiável desmoronamento no final do primeiro semestre de 2020.

No caso em apreço tudo estava facilitado, ao contrário do que sucede com certas doenças (como a tuberculose) que vão avançando sem serem logo ao início diagnosticadas – e em que a manifestação dos seus primeiros sinais (que permitem o diagnóstico) ocorre tardiamente, quando a doença já é incurável. A doença estava perfeitamente diagnosticada; o insensato desleixo, assente na crença de que o silêncio tudo resolve, impediu a cura a tempo. Em suma: o mal do rascunho alastrou‑se… em silêncio, levando o cachopo à (pré‑)ruína.

 

Fase do renascimento?

Como se não bastasse a – há muito anunciada – implosão da paz da fase do declínio, em 28 de junho de 2020 registou‑se a fatal explosão da guerra, com a irremediável publicação do post «Mais uma enigmática… marosca informática». A explosão da bomba estava involuntariamente programada; era e foi inevitável, ante o statu quo da informática. Rebentou com toda a área ao redor, desde o plácido carnívoro acéfalo até à extensa fauna servil que o alimenta(va). Tratou‑se de uma espécie de salutar explosão pírrica, como o supramencionado quadro demonstra.

O tempo não volta atrás e felizmente não apaga o passado. Os factos estão consumadas e as consequências quase homologadas. A criança pomposa que inflava, bradando que «desistir é falhar» (ou «Desistir É Falhar!»), hoje não passa de um adolescente falhado, deprimido, resignado, calado, só.

Agora munido de elementos que lhe permitem estar porventura mais cabalmente esclarecido, ele pretende saber tão‑só se a crise de identidade é para continuar por diversos anos, ou se ainda é possível tentar recuperar destroços mesmo sabendo que nada será como antes. Pior do que os recentes destroços profundos, que levam muito tempo a cicatrizar, são as frias cinzas inertes, que não conseguem renascer.

Depois da tempestade vem a bonança. A guerra civil não foi assim tão negativa. Se nada tivesse sido feito, o puto inválido entraria numa subfase, em que a debilidade permanente por certo daria lugar à morte confirmada. Haja um sentimento positivo, porquanto ninguém gosta de pensar no outono quando existem apenas 15 primaveras. Eis a dificuldade do futuro recuperado, ou então unicamente a simples memória de mais um passado afundado.

 

 

P.S. – O grosso da análise aqui constante, designadamente no tocante às fases do encanto, da incerteza e do declínio, foi efetuado há meio ano, pouco após a publicação, em 25 de abril de 2020, do verbete «Fresbook e não Facebook do FRES». O fim da fase do declínio levou impreterivelmente à necessidade de proceder a ajustes no texto. Os outros ajustes virão – ou poderão vir – na próxima oportunidade de debates presenciais, quando o moço se sentir revigorado e tiver as hormonas da puberdade algo recompostas, momento esperado – ou desejado – para breve. Haja fé na sua recuperação.

Fresbook e não Facebook do FRES

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